sábado, 15 de janeiro de 2011

Agricultura celeste?



Outro dia conversava com uma amiga das ciências médicas que admiro muito, admiro principalmente pelo fato dela buscar fazer uma contraposição dentro dessa área tão positivista. Tal amiga, fazendo uma análise sobre a alimentação humana, o consumo de carne, verduras, alimentos de origem animal...enfim, poderia dizer que minha amiga é uma espécie de especialista quando o assunto são formas alternativas de alimentação que não demandem o sofrimento animal. 


Porém essa criatura tão coerente e indignada com os rumos que as sociedade humanas tomaram e com nossa capacidade de explorar as mais diversas esferas da natureza, inclusive nós mesmos e, principalmente, os animais, declarou-me: "os índios são extrativista!" Tá, tudo bem, também não gosto do discurso que defende a 'cultura indígena' como o baluarte da harmonia ser humano-natureza (se é que podemos falar de cultura no singular e mais ainda de cultura indígena), mas partindo desse pecado original ou pressuposto...
Bom, extrativistas quem, cara pálida? O que sabemos do extrativismo "indígena" (?). Extrativistas somos nós, os maiores monocultores que já existiram. Além de dominarmos altas tecnologias para o desenvolvimento e produção de alimentos dos mais diversos para toda a humanidade, continuamos servindo animais à mesa e, impelindo outros humanos-animais a nos servirem. Continuamos na idade da pedra ou na idade do capital em termos de socialização do conhecimento? Ou será tudo uma questão de classe e estava certo o velho Marx? Ora, até eu, uma mera professora de sociologia, sou capaz de comprar um pequeno terreno e viver do que produzir nele, claro que para isso terei que abrir mão de diversos PRODUTOS de nossa civilização, produtos que não quero e nem vou abrir mão. Mas também não vou acreditar que empresas como a natura, victoria secrets e outras tantas se preocupam mais com a natureza do que os chamados índios só por não testarem seus produtos em animais.


Voltando à questão dos 'índios extrativistas', gostaria de dizer que não sobrou ninguém para contar a história e nos dizer se eles plantavam ou não. Mas por mais precária e sem ferramentas que sejam as ciências humanas, de uma coisa sabemos: índio é apenas uma referência à semelhança fenotípica que europeus, homens de sua Idade Média, encontraram entre os povos do 'novo mundo' e alguns povos do oriente já conhecido e explorado, enfim... Portanto, não devemos esquecer que Astecas, Maias e Incas também eram "índios" ou não eram, tal como outros povos disseminados daqui e mais ainda, as citadas civilizações que acabaram recebendo algum reconhecimento social foram grandes agricultores e acho pouco provável e, até um pouco preguiçoso, acreditarmos que o extrativismo foi a única forma de produção de alimentos utilizadas por tantas organizações sociais dizimadas; as quais se convencionou chamar de grande “Nação Tupi” quando o termo índio já refletia a limitação de nosso conhecimento sobre as práticas sociais de nossos ancestrais não europeus. Além disso, está completamente ‘fora de moda’ não considerar a categoria diversidade e coisa e tal. Mas que grande Nação Tupi é essa? Que unidade de práticas de produção da vida social são identificadas como universais entre aqueles povos que aqui habitaram antes de seu genocídio? Sinceramente, não sei, só sei que índio é um termo bem abstrato e pouco nos diz sobre a vida social que existiu em nossa América. Talvez, “nação tupi” seja mais amplo e consistente em comparação à nomenclatura “índio”. Para mim parece menos amplo, um pouco mais coerente e até superficialmente respeitoso, já que lhes dá um nome próprio. Mas será que não continuamos negando a diversidade humana que aqui existiu? E, para finalizar, acredito que se queremos dar continuidade a utopia de um novo mundo, devemos começar aprendendo com a mais alta ciência do homem branco, europeu e blá,blá,blá em consonância com o resgate da história massacrada daquel@s que conhecemos por inferências históricas realizadas pelos mesmos homens.

Última coisa, uma característica de meus escritos é a utilização da @, pois acredito que assim posso não me limitar ao substantivo homem ou qualquer outro substantivo masculino quando me refiro aos seres humanos, todavia quando falei da ciência européia usei a nomenclatura homem, apenas pelo fato de que a ciência vem sendo de forma hegemônica realizada por homens e não por seres humanos de um modo geral.
Retomando, para finalizar, a temática da diversidade de elementos e práticas sociais que foram realizadas por nossos famosos 'índios", bom os mais respeitados deles, a questão do reconhecimento que já tangenciei...enfim - os Incas, essa suposta unidade, comportava uma série de arranjos sociais com diferentes dialetos, estima-se que mais de 700, só para se ter uma idéia. Ou será que eram idiomas e não se pode admitir isso sem cair na culpa de que dizimamos mesmo um monte de seres humanos? Acho que dialeto é mais uma forma que a ciência masculina e européia encontrou para amenizar as perdas humanas de seus impercursos por nossa Terra.





BRUNA SICHI GONÇALVES
Professora de Sociologia

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